25% dos motoristas de aplicativos desistiram do trabalho devido a alta dos combustíveis


Associações de motoristas de aplicativos revelam que milhares de pessoas estão desistindo de trabalhar devido aos constantes aumentos no preço dos combustíveis. Com sucessivas altas nos últimos meses, o valor atingiu índices recordes em 2021, e o preço médio da gasolina já está acima de R$ 6 em alguns estados.

Mas se por um lado os custos para trabalhar ficam cada vez mais altos, por outro as empresas responsáveis pelos aplicativos não reajustam as tarifas para motoristas há anos. Segundo o presidente da Amasp (Associação de Motoristas de Aplicativos de São Paulo), Eduardo Lima de Souza, os pagamentos são os mesmos desde 2015.

Neste cenário, os motoristas se veem obrigados a trabalhar cada vez mais para ter algum lucro. Mesmo assim, está difícil evitar prejuízos, o que fez 25% dos motoristas de São Paulo deixarem as plataformas desde o ano passado, de acordo com Souza.

motoristas de aplicativos
Preço dos combustíveis força motoristas de aplicativos a trabalharem mais de 12 horas por dia. Foto: Reprodução/Canva

Segundo o presidente de Amasp, que diz representar cerca de 62 mil trabalhadores, a conclusão sobre o número de desistências partiu de uma base de dados da prefeitura. No início de 2020, eram 120 mil motoristas cadastrados, hoje são 90 mil.

Os motoristas entraram numa fase crítica depois desses consecutivos aumentos dos combustíveis. Uma situação muito grave. Não tivemos reajuste de tarifa nem para acompanhar a inflação desde 2015. O motorista vem sentindo isso e muitos vêm desistindo desde o início da pandemia, em 2020″, declarou Souza em entrevista à BBC Brasil.

Procuradas pela reportagem, as maiores empresas do segmento no país, Uber e 99, não discordaram dos dados nem apresentaram seus números. As plataformas afirmam não ter nenhuma relação com as altas no preço dos combustíveis e que fazem parcerias com redes de postos para oferecer descontos aos motoristas.

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Quanto ganham os motoristas de aplicativos?

Segundo dados da plataforma “Motorista Elite”, especializada neste segmento, hoje os motoristas de aplicativos ganham em média R$ 20 por hora de trabalho.

Entretanto, é importante destacar que esse valor pode variar, pois há fatores como oferta, demanda, número e distância das viagens, entre outros.

Seguindo esta média, a plataforma calcula que motoristas que trabalham pelo menos 9 horas por dia podem ter um faturamento diário de R$ 200 a R$ 280. Esse já é um valor estimado para quem faz viagens em tempo integral, e não como complemento de renda.

No entanto, este valor diz respeito ao faturamento total, ou seja, não considera os descontos por custos com combustível, manutenção e prestação ou aluguel do carro. Com os combustíveis cada vez mais caros, muitos motoristas estão tendo que trabalhar mais horas por dia para cobrir as despesas.

Por conta disso, é comum encontrar quem trabalhe 12 horas ou mais por dia para que as viagens valham a pena. É o caso de Ana Paula Aparecida de Oliveira, que trabalha 14 horas por dia em dois aplicativos diferentes. Ana Paula conta que a jornada é bastante puxada, mas necessária, e que todos os dias pensa em desistir.

Segundo ela, motoristas relatam que estão exaustos, deprimidos e desesperados por não saberem se terão condições de pagar as contas no final do mês.

Este cenário de desvantagens faz muitas pessoas desistirem e procurarem por emprego em outras áreas. Entre elas está Daniela Cristina Teles, que afirma que os aplicativos aumentaram o valor para os passageiros, mas não repassaram para os motoristas.

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Motoristas cobram ações de empresas e autoridades

Com as viagens cada menos vantajosas para os motoristas, associações cobram medidas para melhorar a situação. Uma das principais reivindicações é para que as plataformas aumentem os valores repassados aos trabalhadores.

Segundo o presidente da Amasp, outra cobrança da categoria é por uma redução do ICMS dos combustíveis. Com isso, o combustível ficaria mais barato para os motoristas de aplicativos, permitindo lucros maiores e rotinas menos exaustivas.

Os representantes da categoria também pedem por um programa de auxílio para motoristas instalarem Gás Natural Veicular (GNV) em seus carros. Em comparação ao consumo de gasolina, o GNV permite uma economia de mais de 50%, mas a sua instalação chega a custar R$ 4.000.

Enquanto isso, muitos motoristas se veem obrigados a escolher corridas para não ter prejuízo. Conforme explica Souza, isso se tornou comum quando o motorista percebe que irá gastar mais para buscar o passageiro do que o valor que ganhará pela viagem.

Semana passada, tive de rodar 17 minutos (5,9 km) para chegar ao passageiro. Quando o peguei, percorri 1,5 km em cinco minutos. Ganhei R$ 8 pela corrida, o que mal deu para pagar o combustível, já que meu carro faz 5,9 km com um litro de etanol”, contou o presidente da Amasp.

Além disso, Souza ainda afirma que o algoritmo do aplicativo liga motoristas a passageiros que estão longe, ao invés de acionar quem está mais próximo, e muitas vezes ainda cancela a corrida sozinho.

Fontes: BBC News Brasil e Motorista Elite.

Jornalista, ator profissional licenciado pelo SATED/PR e ex-repórter do Jornal O Repórter. Ligado em questões políticas e sociais, busca na arte e na comunicação maneiras de lidar com o incômodo mundo fora da caverna.