Lei de Cotas pode acabar em 2022? Entenda o caso e veja a opinião de especialistas
Se não for renovada pelo Congresso Nacional, a Lei de Cotas para as instituições de ensino federal pode acabar no ano que vem. O risco existe porque a lei perderá a validade em 2022 se não houver o processo de prorrogação.
Um dos principais pontos de preocupação é o fato de a revisão da lei criada em 2012 estar por conta do governo Jair Bolsonaro (sem partido). Bolsonaro é antipático à Lei de Cotas e não vê o racismo como um problema estrutural do Brasil, o que representa um risco de acabar com a medida.
Além disso, a revisão da lei deve acontecer em ano eleitoral, momento em que a polarização política tende a ficar ainda mais crítica. Por isso, o movimento negro teme o retrocesso em uma política que especialistas em educação e políticas públicas avaliam como bem sucedida.
Diante deste perigo eminente para a Lei de Cotas, o reitor e fundador da Universidade Zumbi dos Palmares, José Vicente, afirma que já há um movimento de criação de uma ampla frente de defesa da renovação da medida.
Vicente ainda lembra que a Lei de Cotas não diz respeito apenas a vagas em instituições de ensino. Também estão subordinadas à esta legislação as cotas da magistratura, do serviço público federal e do Ministério Público.
Segundo ele, se a lei não for renovada, todas as políticas de cotas no Brasil serão canceladas. Para o reitor da Zumbi dos Palmares, isto seria uma perda inominável para o país, pois as cotas ainda têm um longo caminho a percorrer para dar conta do que se propuseram.
Momento atual é crítico para as políticas de cotas
De acordo com Vicente, que também é sociólogo e advogado, o cenário atual no Brasil impõe um desafio a mais para a revisão da medida. Isso porque assim como tem acontecido com as políticas de combate ao novo coronavírus, há o risco de a discussão perder seu caráter técnico e virar bandeira política.
O reitor avalia que o potencial do atual governo de causar polarizações pode levar a Lei de Cotas para um ambiente de conflito e confronto. Nesse caso, ele afirma que os negros não poderiam fazer a defesa sozinhos, e que seria preciso um grande concerto nacional para defender a medida.
Se a luta já estava difícil antes, agora com Bolsonaro e companhia vai ser uma pedreira”, destacou Vicente em entrevista à BBC Brasil.
Entre as figuras do governo que prejudicam esta e outras importantes políticas públicas para a demanda da população negra no Brasil, o reitor destaca o Presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. Apesar de presidir uma instituição fundamental para o combate ao racismo estrutural no Brasil, Camargo ataca constantemente pautas e personalidades do movimento negro no país.
Para Vicente, além de não ter construído nenhuma política pública de enfrentamento ao racismo estrutural, Camargo descontruiu, danificou e praticamente extinguiu diversas políticas fundamentais para a causa com sua postura e atitude. O reitor acredita que o presidente da Fundação Palmares presta um desserviço ao tema.
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Período de pandemia ressalta como a Lei de Cotas não pode acabar
Vicente avalia que em quase um ano de pandemia está evidente que a crise sanitária afeta os negros e estudantes negros de forma mais intensa.
Segundo ele, há dois motivos para esta situação. O primeiro é que os negros estão nos empregos mais afetados pela pandemia – informalidade e pequenas e médias empresas. Com isso, eles foram os primeiros a perderem emprego e renda.
O segundo ponto diz respeito ao acesso à educação. O sociólogo avalia que este é o público com maiores dificuldades de acesso de qualidade à internet, por conta de limitações econômicas. Dessa forma, há uma série de barreiras para o jovem negro realizar seus estudos, resultando num grau de aprendizado menos efetivo.
Por isso, o reitor destaca que é essencial um trabalho para construção de pontes, para diminuir ou eliminar a dificuldade de acesso do negro ao ambiente tecnológico. Para ele, o ensino híbrido veio pra ficar, então é necessário que todos tenham plenas condições de estudar nesse formato.
Entretanto, Vicente não acredita que o governo federal vem cumprindo seu papel na educação durante a pandemia, assim como não cumpriu na saúde. Segundo ele, o governo deveria ter coordenado ações num plano nacional para encaminhar essa questão, mas agiu de forma omissa e o resultado é que ainda não há um cronograma de como será em 2021.